sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Resenha, para aula de livro-reportagem, de Rota 66, do célebre Caco Barcellos

Recente edição do livro
Para escrever o livro Rota 66, a História da Polícia que Mata, o jornalista brasileiro Caco Barcellos levou cerca de oito anos pesquisando a morte de inocentes pela Polícia Militar de São Paulo.

Nas primeiras páginas, o leitor depara-se com uma narrativa emocionante: uma perseguição feita pela viatura 66 das Rotas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota), grupo de elite da Polícia Militar de São Paulo.

Mesmo não estando presente na perseguição, Caco narra o acontecimento como se estivesse lá; através de relatos de testemunhas, ele monta uma obra jornalística que poderia ser confundida com uma ficção, não fosse o árduo trabalho de pesquisa, que o levou a expor no livro dados concretos sobre o assassinato de inocentes.

Esse tom fictício, que leva o jornalista a descrever até o momento em que os perseguidos trocam a marcha do carro, é constante na obra. Faz com que o livro se torne mais leve, apesar do conteúdo pesado, e torna a leitura agradável, quase um romance.

O primeiro crime que Caco relata no livro é o assassinato de quatro jovens da elite paulista pela Rota 66. Além de descrever a perseguição, Caco complementa a narrativa com detalhes pessoais de cada jovem. Mostra a reação da Polícia ao saber que havia matado gente graúda, a repercussão do crime na mídia, a reação das famílias. Tudo com muitos detalhes, criando a falsa sensação de que Caco presenciou tudo.

 Apesar de esse ser o crime que inicia o livro, e que até dá título à obra, Caco diz, em determinado trecho, que está ali para defender os pobres, para dar ouvidos à classe que vive na margem da sociedade.

A partir daí, o leitor é levado às periferias paulistanas, conhecendo gente humilde que muitas vezes apenas chora seus mortos, sabendo que, se protestar, não será ouvida.

Além da extensa pesquisa no IML, nos arquivos da Polícia, nos jornais que noticiam as “perseguições seguidas de tiroteio” onde nunca algum policial é ferido, Caco tem o trabalho de fazer essas famílias se exporem. Muitas não denunciam os crimes porque tem medo de represálias.

O conteúdo que Caco apresenta em sua obra é revoltante. Mostra a Polícia criada pela Ditadura, que mata e depois pergunta. Gente inocente, que trabalha, com características bastante perseguidas: em sua maioria, são negras ou pardas. Morrem simplesmente por que a polícia desconfia de sua honestidade.

Caco conseguiu um resultado extraordinário: além dos nomes dos matadores, fez uma ficha que mostra o método, de cada um, usado nas execuções. O que mais deixa o leitor com sensação de impotência, diante destes crimes, é ver que as autoridades que poderiam fazer algo a respeito, encobrem a Polícia Militar.

É inconcebível pensar que é a própria Polícia Militar quem julga seus criminosos, uma vez que, além de sempre absolvê-los, os incentiva e premia os que matam mais.
É difícil não se emocionar em alguns trechos, que mostram execuções de pais de família, e até de crianças.

Para os jornalistas e estudantes de comunicação social, Caco fez uma obra memorável. Seu método de pesquisa, a precisão dos fatos, a responsabilidade em informar e a coragem para enfrentar essa esfera medonha da sociedade, são inspirações que devem estar presentes sempre nos que exercem a profissão.

Caco disse certa vez, e com razão, que gostaria que Rota 66 fosse uma página virada, mas que ainda não o é. No Brasil e no mundo, a Polícia ainda é arbitrária e continua impune.

Caco Barcellos

               


               



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